Arrendamento ou parceria? Atenção para a possibilidade de crime tributário

O agronegócio é um dos setores mais importantes da economia brasileira. Essa óbvia afirmação é facilmente amparada pelos números. Segundo dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA) o setor deve representar 24,3% do PIB brasileiro. Considerando toda a cadeia de negócios, estima-se que o agro irá gerar um total de R$ 2,63 trilhões neste ano de 2023.

Em termos de produção, a mais recente previsão do IBGE estima que a atual safra será recorde, com 318 milhões de toneladas, entre cereais, leguminosas e oleaginosas. Na pecuária, existe uma previsão de que teremos em 2023 a maior produção de carne bovina na história.

Para que esses resultados aconteçam, existe um fator preponderante: a terra. Seja na produção de lavouras, na pecuária, na produção agroindustrial ou na exploração extrativista, é ali onde ocorre o trabalho efetivamente. E em meio a um país com extensões gigantescas como o Brasil, existem muitas particularidades em relação a esse bem imóvel. Muitos possuem terras, mas não têm como produzir ou não pretendem encampar produções. Outros, possuem a força de trabalho, mas não têm a terra. E é neste contexto que atua o Estatuto da Terra, uma legislação de 1964 que regulamenta as relações fundiárias no país.

Nesta lei estão definidos dois tipos de contratos rurais muito importantes para o cotidiano do agronegócio: o arrendamento e a parceria. Um, de natureza meramente concessionária e o outro de natureza mista, em que a cessão do imóvel é apenas um dos elementos contratuais.

O arrendamento, de forma simples, é uma espécie de aluguel de um imóvel rural para que um produtor possa explorar o espaço com suas atividades rurais. Nessa explicação básica nós já podemos perceber algo importante neste tipo de contrato. O arrendante, dono do imóvel, não assume nenhum risco em relação à produção. Sua única fonte de renda no arrendamento é o valor acordado para cessão daquele lote de terras. Todos os riscos, despesas e lucros inerentes à produção rural ficam a cargo do arrendatário, e isso inclui, claro, questões tributárias relativas ao agronegócio.

A parceria, como o nome já indica, é uma união entre o dono do imóvel e um produtor. Eles irão atuar juntos na exploração econômica da propriedade. Ou seja, os riscos, despesas e lucros são divididos entre os contratantes, seguindo as margens fixadas pela legislação, de 20% a 75%, de acordo com os critérios. Em termos práticos, é como se existisse uma sociedade entre o proprietário e o produtor rural.

Diferenças tributárias e riscos penais

Como é facilmente perceptível, existem distinções significativas entre os dois contratos. Naturalmente, os impactos tributários também são bastante diferenciados. Em linhas gerais, um contrato de parceria é bem mais vantajoso ao proprietário do lote do que no arrendamento sob o aspecto fiscal.

O Imposto de Renda do arrendamento é tributado para proprietários pessoa física como uma locação urbana comum, sujeitos a faixa de alíquotas que vão de 7,5% a 27,5%, com retenção na fonte se o arrendatário for PJ ou recolhimento mensal obrigatório se também for pessoa física. Em caso de o proprietário ser pessoa jurídica, a alíquota total pode chegar a 34%. Na parceria, o proprietário fica sujeito a uma carga tributária máxima de 5,5% com base nos resultados obtidos pela parceria, e sem obrigações mensais.

Diante disso, não é incomum a celebração de contratos de parceria quando, na verdade, a relação existente entre as partes é do arrendamento. E isso pode gerar consequências bastante danosas. A Receita, se identificar tal ação, pode desqualificar o contrato e tratar a questão tanto pela via administrativa quanto pela representação penal. No âmbito administrativo, podem ser aplicadas multas de até 150% do valor do tributo. Já na questão criminal, após o julgamento administrativo, o contribuinte poderá ser indiciado por crime tributário, ficando sujeito a uma pena de detenção de dois a cinco anos, além de multa. Ainda que caiba à Receita Federal (no aspecto administrativo) e ao Ministério Público Federal (na seara criminal) comprovarem efetivamente a simulação contratual, a impossibilidade do uso da presunção não pode nem deve relativizar a importância do tema pelos contribuintes.

Explicadas as diferenças de ambos os contratos, resta a pergunta: como evitar qualquer tipo de indiciamento e, ao mesmo tempo, ter um tratamento tributário condizente e adequado? A partir de um planejamento tributário. É com base nesse instrumento que vai ser possível que você consiga fazer o pleno uso da sua terra, seja por meio do arrendamento ou parceria, de forma segura e benéfica. Esse planejamento não deve se concentrar apenas nas vantagens financeiras que a legislação tributária brasileira pode permitir em determinados casos, mas também ter um olhar voltado ao direito penal tributário, evitando assim perdas financeiras e afastando qualquer risco penal existente.

Referências:

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