Reduzir a carga tributária de uma empresa é sinal de uma boa gestão financeira. No entanto, o planejamento legalmente autorizado tem seus limites e estar ciente deles é essencial para não gerar consequências criminais para sócios e gestores de uma empresa. A linha tênue entre elisão e evasão fiscal deve estar no radar de todo o corpo diretivo. Por isso, neste texto, explicamos quais são os limites a não ultrapassar nessa tarefa.
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Elisão fiscal x Evasão fiscal
A elisão fiscal é o uso legítimo dos instrumentos previstos na lei para reduzir a carga tributária. Para ter sucesso nessa tarefa, o conhecimento profundo do sistema tributário é estratégico para o Diretor Financeiro (CFO) e todo o corpo jurídico da empresa. A legislação pode ser uma bússola a favor da corporação, pois conhecer a lei indica caminhos para regimes tributários atrativos. Dessa forma, o negócio pode eleger um regime ideal para suas necessidades, aproveitando incentivos e estruturando operações de forma inteligente, o que pode garantir a sustentabilidade financeira de uma empresa. Esse resultado não só é possível como é altamente desejável.
Já a evasão fiscal acontece quando se burla a lei, seja ocultando informações, simulando operações ou deixando de pagar tributos de forma deliberada. A diferença está no propósito, na forma e, principalmente, nos olhos de quem analisa a operação. Fazendo uma analogia muito singela com as estradas, a elisão é você escolher o caminho com menos pedágios, já a evasão é furar o pedágio. Mas que práticas promovem a elisão e quais incorrem em evasão?
Onde está o limite?
A vontade de otimizar o pagamento de tributos e simplificar as prestações com a Receita Federal é legítima. No dia a dia de empresas, por exemplo, podemos listar alguns casos. Escolher o regime de tributação mais vantajoso, por exemplo, configura-se como elisão. Ao escolher entre Lucro Real, Lucro Presumido ou Simples Nacional, a empresa analisa qual estrutura permite menor carga tributária sem distorcer a realidade do negócio. Usar dados contábeis, margens de lucro e projeções de receita para essa escolha é uma estratégia legítima, da mesma forma que fazer uma reorganização societária com propósito real também é.
Além disso, antecipar ou postergar operações para aproveitar incentivos fiscais é outra possibilidade de elisão. Imagine que sua empresa vai adquirir um equipamento de alto valor e sabe que, a partir do próximo mês, termina um benefício de crédito de ICMS para esse tipo de compra. Antecipar essa aquisição para aproveitar o incentivo é uma ação pensada com base na legislação vigente, que gera economia sem violar nenhuma regra.
Mas certas ações podem violar limites estabelecidos na legislação. Manobras como dividir artificialmente uma empresa para simular enquadramento no Simples Nacional é um caso clássico, bem como o uso de laranjas para ocultar faturamento ou patrimônio. Outro caso comumente visto nos tribunais é o de empresas que transferem seu CNPJ para outros estados, visando a alíquotas menores de ICMS, mas que continuam operando no mesmo local, o que configura evasão fiscal por simulação. Essas práticas são entendidas pela legislação ou pela jurisprudência como evasão fiscal, logo, podendo causar repercussões penais para empresários.
O papel do CARF
Quando o Fisco autua uma empresa é possível ao contribuinte (pessoa física ou jurídica) realizar a contestação do auto de infração. Em última instância, o caso pode chegar até o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), que funciona como um tribunal administrativo, vinculado ao Ministério da Fazenda. É no CARF que diversos planejamentos tributários são testados: enquanto o contribuinte defende a legalidade da operação, a Receita tenta comprovar que houve abuso ou simulação.
Além de analisar casos, o CARF é peça essencial na formação da jurisprudência que influencia toda a atuação do Fisco. Logo, a atuação do Conselho deve ser acompanhada de perto por Diretores Financeiros e Jurídicos, que podem inclusive contar com assessoria jurídica especializada como ferramenta de governança.
Quando vira caso criminal
Contudo, o CARF não é o destino final de muitos casos. Caso a Receita entenda que houve fraude intencional, ela pode acionar o Ministério Público, e aí o caso entra na esfera penal. Neste caso, falamos de crimes elencados na Lei nº 8.137/1990, como Sonegação fiscal, Falsidade ideológica, Lavagem de dinheiro, e até organização criminosa, em situações mais graves.
Ou seja: o que começa como uma discussão tributária pode terminar com investigações criminais contra a empresa e seus gestores. É nesse momento que a presença de um advogado criminalista especializado no meio empresarial se torna indispensável, e não apenas recomendada.
O planejamento estratégico do regime tributário da empresa deve ser parte de uma política de compliance e governança. O segredo está em estruturar os planejamentos com propósito real, consistência jurídica e documentação clara. O diálogo constante com o time jurídico é essencial para proteger os interesses e a saúde financeira e jurídica de sua empresa. Registre as bases de cada decisão. E, se o Fisco bater à porta, esteja pronto, com números sólidos e apoio técnico de quem conhece as regras do jogo. Planejar é estratégico. Burlar é arriscado e pode virar caso de polícia.