Comentário Julgado TJSC

Não raro ao criminalista é dado o dever de reafirmar o óbvio. Ao contrário do afirmado recentemente pelo E. Tribunal de Justiça de Santa Catarina, cuja ementa segue abaixo, não há inversão de ônus da prova no processo criminal. Condenações são proferidas, e até mantidas, quando a carga probatória, cujo ônus é inteiramente do órgão acusador, a incidir sobre a autoria e materialidade do delito aponta, sem rodeios, para este sentido. Reverter a absolvição ao argumento de que deveria ter o réu apresentado “defesa minimamente plausível” afronta sobremaneira a máxima de que não há divisão de ônus ou de carga probatória no processo penal e, consequentemente, não se inverte o ônus da prova em processamentos criminais.

Tal conclusão encontra largo escólio na doutrina (v.g., LOPES JR., Aury. Direito processual penal. 12ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 365) e em diversos posicionamentos do Supremo Tribunal Federal ao esclarecer que “as acusações penais não se presumem provadas, cabendo inteiramente ao Ministério Público o ônus de demonstrar a culpabilidade do réu.” (trecho do voto do Eminente Ministro Celso de Mello na AP 1.018/DF)

APELAÇÃO CRIMINAL – RECEPTAÇÃO (ART. 180, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL) E ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR (ART. 311 DO CÓDIGO PENAL) – SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA DA DENÚNCIA – RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. PRETENDIDA A CONDENAÇÃO DE AMBOS OS ACUSADOS NA CONDUTA TIPIFICADA O ART. 311 DO CÓDIGO PENAL – POSSIBILIDADE – AUTORIA E MATERIALIDADE DEMONSTRADAS DE MANEIRA SATISFATÓRIA – NÃO APRESENTAÇÃO DE UMA JUSTIFICATIVA COERENTE PELA DEFESA – CONDENAÇÃO QUE SE IMPÕE. Quando o agente é flagrado na posse de veículo com sinal identificador adulterado, ocorre uma verdadeira inversão do ônus da prova, tal como nos casos de receptação, cabendo ao réu apresentar uma defesa minimamente plausível, a fim de demonstrar sua ignorância/inocência acerca dos fatos. RECURSO PROVIDO. Processo: 0017862-31.2017.8.24.0038 (Acórdão). Relator: Luiz Antônio Zanini Fornerolli. Origem: Joinville. Órgão Julgador: Quarta Câmara Criminal. Data de Julgamento: 12/03/2020. Classe: Apelação Criminal.

Comentários dos advogados Maria Francisca Accioly e Daniel Laufer